Prazer. Chamo-me Marie, tenho 27 anos, trabalho para o FBI e sou uma psicopata.
Ei, não se assuste, não é como se eu
fosse te matar através de uma folha de papel. Na verdade eu não te mataria de
modo algum, á não ser que você fosse um criminoso federal e eu não conseguisse
prende-lo. De qualquer modo, eu não lhe mataria.
O problema das pessoas é que elas
sempre acham que um psicopata é mau. Mas como poderíamos ser maus, se nem temos
sentimentos? Vai ver é por isso que não gostam de nós, porque não temos
necessidade de esconder sentimentos, enquanto vocês “normais”, precisam á todo
momento conviver com o que sentem.
-Senhorita Van Der Bor, o Doutor
Hanks lhe espera.
Acenei para a secretária/
recepcionista, levantei-me de meu lugar e fui para a sala do “misterioso”
terapeuta.
-Bom dia, senhorita Marie. – Ele
levantou-se e sorriu. Era um senhor com mais de cinqüenta anos, ralos cabelos
grisalhos, um terno alinhado e um sorriso açucarado.
-Bom dia, Doutor. – Fechei a porta
atrás de mim, e a tranquei. Conseguindo fazer sem que o doutor percebesse.
-Como se sente? – Ele se sentou.
Pergunta interessante. Como eu me
sinto? A verdadeira pergunta é se eu sinto algo? E a resposta é não, não sinto
nada. Mas...
-Me sinto bem. – Não queria levantar
aquela questão naquele momento, por isso fiz o mais fácil. Menti.
Eu me encostei no óbvio divã, mas
sem me deitar. Seria patético demais e poderia me atrasar em alguma ação de
surpresa.
-Corajoso o bastante para fazer as
perguntas? – Arquei uma sobrancelha.
-Não tenho medo de você, Marie. –
Ele disse querendo passar confiança.
Pois ali estava seu erro, deveria
ter sentido o medo antes, assim não seria pego de surpresa.
-Então, comece á fazê-las.
-Quando você percebeu que era uma...
– Ele próprio se interrompeu. Sorri maliciosamente.
-Psicopata, doutor. Eu sou uma
psicopata. – Eu o completei e o acusei: - Surpreende-me o fato de o senhor, um
profissional, se envergonhar de me chamar pelo o que sou.
-Eu iria completar a minha pergunta.
– Ele disse mostrando ligeira irritação. – Se a senhorita tivesse esperado um
pouco.
Dei de ombros. – Sabia que essa
coisa de ser “senhorita” é até um pouco interessante?
Ele não deu muito atenção. Erro após
erro.
-É interessante porque estou com 27
anos e nunca tive um relacionamento sério. Acho que descobrir que a mulher com
quem você sai é uma agente do FBI e psicopata não ajuda muito em construir um
namoro.
-Estranho. Já que você é bem bonita.
– Reparei que dessa vez ele não disse o habitual “senhorita”. Intimidade
forçada, doutor. Mais um erro.
-Obrigada. – As pessoas sempre me
diziam o quão bonita eu sou, rosto delicado, pele dourada, longos cabelos
castanhos e olhos esverdeados. O problema era quando eles descobriam sobre a
minha saúde mental. A partir daquele momento, a antes mulher bonita, virava uma
louca fora do hospício. – Mas por mais estranho que pareça, nem tudo é beleza,
doutor. – Fui sarcástica. – Termine sua pergunta.
Ele acenou.
-Quando você percebeu que era uma
psicopata? – Ele finalmente pronunciou o nome certo. Depois cruzou as pernas e
pegou o seu bloquinho de papel.
-Penso que foi no momento em que meu
colega no jardim de infância caiu dos brinquedos do parquinho e quebrou o
pescoço.
Ele demonstrou surpresa, mas logo a
escondeu.
-O que você fez perante isso?
-Desci do escorregador, circulei seu
corpo sem vida e fui atrás da professora. Chegando lá, disse á ela que o garoto
havia morrido. Ela se desesperou e foi conferir com seus próprios olhos. Comportei-me
normalmente, olhando os paramédicos pegarem o corpo do garoto, depois saí do
parquinho e voltei para dentro da sala de aula, queria ficar ali, pois não
tinha nada mesmo para fazer, mas a escola foi fechada por 2 dias, e eu acabei
ficando em casa.
-E como as pessoas reagiram á esse
seu curioso comportamento?
-As pessoas pensavam que eu estava
em estado de choque, mas o estado de choque nunca passou, de fato continua até
hoje.
Ele escreveu algo em seu bloco de
papel. Aposto que eram apenas rabiscos.
-Você visitou outros terapeutas,
durante sua vida? – Ele perguntou ainda olhando para os rabiscos.
-Bem, isso é óbvio, já que eu sou
uma psicopata diagnosticada. Vi caras como você durante toda a minha vida. – E
isso não era nem um pouco mentira. Já fui em tantos psicólogos, que já poderia
atender outras pessoas. O difícil seria encontrar alguém que confiasse em mim
para diagnosticá-lo.
-Interessante. Mais uma pergunta:
Como foi sua adolescência?
-Meus pais optaram por eu estudar em
casa, então não foi grande coisa.
-E como você começou a trabalhar no
FBI?
-Foi fácil conseguir um emprego se
uma das exigências era de eu ser a pessoa mais imparcial em julgamentos. Já que
não posso me emocionar, nem se eu vê-lo morrendo aqui, agora na minha frente,
eu acabei conseguindo o emprego.– Disse de brincadeira, mas o meu tom pareceu
não ter sido, porque ele me lançou um olhar assustado. – Demos um jeito, e eu
burlei o teste psicológico. E eu também sou boa em atirar. É meu dom. Isso tudo
facilitou na questão da construção de minha carreira como agente.
-Está em algum trabalho por agora?
-De fato,
estou.
-Gostaria de
falar sobre ele, ou é confidencial?
-Não se
preocupe, de qualquer modo você irá saber. – Joguei a isca, e ele pareceu mordê-la,
mas depois á soltou. O ser humano é tão arrogante, ele de certo estava pensando
que ninguém teria conseguido rastreá-lo, por isso estava tão tranqüilo. Pois
devia preocupar-se mais, já que eu já estava aqui pronta para trabalhar.
-Então.
Houve um cara texano que esquartejou sua mulher, e que estuprou todas as 4 filhas
que havia com ela, além de um menino de 10 anos que também era seu filho. Logo
depois de tudo isso, matou todos e os enterrou em linha reta, ligando a sua
casa á uma encruzilhada, tudo isso com os corpos de seus familiares. Era algum
tipo de ritual satânico, que aparentemente não funcionou. Depois fugiu e agora
estamos em sua cola, quase conseguindo encontrá-lo. – Louis Hanks engoliu em
seco. – E aí Louis, como você conseguiu perder o sotaque sulista tão rápido e
ainda um diploma de psicologia?
A última
pergunta foi o que o fez finalmente movimentar-se. Ele colocou a mão na cintura
da calça.
-Tarde
demais, assassino! – Eu disse, já com a minha arma apontando para a cabeça
dele. Tinha ido com uma camiseta ligeiramente folgada para não mostrar o que eu
escondia em minha cintura.
Ele continuou
com a mão ali.
-Abaixe a mão,
senão eu atiro! – Gritei de novo. Idiota arrogante. Errou aceitando atender um
agente do FBI, errou em se mostrar novato, errou em matar toda a sua família. A
mãe dele errou por tê-lo feito nascer.
-Vamos ver
se você é mesmo uma psicopata. – Movimentou-se, tentando puxar a arma. Mas eu
agi mais rápida e atirei em sua mão.
-Sou uma
psicopata diagnosticada, você é apenas um cara idiota que estragou a sua vida e
de seis pessoas.
Ele se
ajoelhou e inclinou-se sobre sua mão. Sangue escorria enquanto ele
choramingava. Olhei para algo ao lado dele que chamou a minha atenção. Tinha-o
feito perder um dedo e foi bem o do meio.
-Sua
piranha! – Gritou, lançando um olhar cheio de ódio em minha direção.
-Grande
reviravolta, não? – Disse ignorando seu xingamento e me aproximando dele. –
Você achando que tinha se safado, e que estava apenas atendendo uma louca hoje.
– Puxei a manga de minha blusa para minhas mãos e peguei seu dedo do chão.
Estendi á ele. –Acho que isso é seu.
Ele pegou o
dedo com a outra mão e começou a choramingar novamente.
-O que foi,
amigo? Está doendo? Imagina a dor de sua mulher quando não perdeu apenas um
dedo... – Abaixei meu rosto bem próximo do seu envelhecido. – Mas sim todas as
partes, que foram separadas.
Ele não
disse nada, apenas cuspiu em minha cara. Limpei o rosto com a manga da blusa e
apontei a arma para sua outra mão. Mais um tiro, menos um dedo.
Levantei de minha posição ajoelhada
e peguei o celular. Ignorei os choros altos e gritos ocos de Louis. Já havia
algum tempo que a recepcionista estava tentando entrar no cômodo, de certo já
havia ligado para a polícia. Mas a minha hierarquia era bem mais alta que a da
desses oficiais de interior, então nem me preocupei.
Disquei o número e ouvi apenas um
toque.
-Agente Snider.
-Snider, pode entrar. Já estou com
ele... Abatido. – Loius continuava a gritar.
-O que você fez com ele, Marie?
Porque tantos gritos? – Snider perguntou normalmente, como se eu fizesse aquele
tipo de coisa á todo momento. Ele não estava exatamente errado.
-Nada demais, ele que quis atirar em
mim primeiro. Venha e leve-o.
Desliguei o telefone e olhei para
Louis Hanks que havia se calado. Ele desmaiou e finalmente ficou quieto. Para
alguém envolvido em satanismo e assassinato, tinha o psicológico muito fraco.
Ainda bem que eu nem tinha algo desse tipo.
Dei-lhe as costas e destranquei a
porta. A secretária entrou correndo, enquanto eu saia. Mais um dia de trabalho,
menos um monstro solto no mundo. Mas será que é certo um monstro ser pego por
outro monstro?
Juliana
CMC.
Eu lembro quando você me mostrou esse conto. De todos os que você já escreveu é meu preferido. Perfeito!! Eu lembro que você me disse também que sempre quis escrever um conto sobre psicopatas, e escreveu, um maravilhoso aliás, já to amando seu blog amiga. Beijos.
ResponderExcluirObrigada amiga. Sua opinião é a mais importante pra mim. Fico feliz por ter gostado, e por fim ter conseguido escrever algo sobre um psicopata. Tenho vontade de escrever mais sobre eles, são fascinantes.
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